NÚCLEO DE CRIAÇÃO :: NEWSLETTER 2


SEGUNDO CICLO :: 2010

UMA OUTRA VOLTA

A segunda rodada de apresentações do Núcleo trouxe projetos pessoais de cada um dos integrantes e nossos primeiros estudos de caso, de processos criativos selecionados pelo encanto. Martha Nascimento abriu o ciclo com um olhar sobre a moda e os costumes: do jeans à burca, ela percebe a lógica da identificação coletiva, os constrangimentos morais, a tradição cultural e a polêmica da sensualidade entre expor e cobrir o corpo. O trabalho de Martha tornou-se, para ela, uma publicação internacional, e desdobrou novos estudos sobre o blue jeans no Núcleo. Frederico Carvalho Junqueira realizou uma palestra interativa, para discutir o trabalho dos estúdios Disney de animação e a criação 3D contemporânea – ele investiga o conceito por trás do enredo, o enredo por trás da imagem. Jordana Simonaggio e Vanessa Tiemi Doi apresentam trabalhos introspectivos. Questionam a própria apresentação pessoal, a qualidade de sua espontaneidade, a angústia de quem se propõe a falar de si e experimenta buscar como e o quê dizer. Descobrem censuras. Doda Ferrari, responsável pela arte final do primeiro projeto externo do Núcleo de Criação – o projeto BLUE - desenvolvido com orientação presencial de Lincoln Seragini, mostra à turma o desfecho do trabalho iniciado por nós em pesquisa colaborativa. O jornalista Paulo Piza estuda as possibilidades e perspectivas do jornalismo institucionalizado. Expõe à turma diferentes estilos jornalísticos, discute verdade e qualidade literária, nuances da relação entre foto e texto, e a tendência da notícia online. Pesquisamos o Núcleo para constatar que a principal fonte de notícias para esta turma é o twitter. Ana Naccarato considera o fascínio do romance contemporâneo como gênero literário, uma de suas raras preferências pessoais – aponta especialmente o trabalho do autor Nicholas Sparks (de Nights in Rodanthe) e seu desdobramento no cinema. A caminho da conclusão, assistimos à erudita apresentação de Ciro Visconti, que analisa e interpreta os primeiros 20 minutos do filme 2001 – Uma odisséia no espaço, de Kubrick, sobre a criação do mundo e o início da cultura, em paralelo a uma discussão das condições de composição e criação na música erudita e no cinema. O fechamento do ciclo acontece no retorno de Vanessa Tiemi Doi, que apresenta agora, em detalhes, o processo criativo, o trabalho e a história do baterista Aquiles Priester, fundador da banda Hangar no Brasil e considerado uma das maiores estrelas da bateria mundial – Vanessa acompanha a banda e é responsável por alguns de seus mais recentes projetos gráficos, de publicação mundial.

ALTERNÂNCIAS

1. Inspiração 2010! A convite de João Batista Ferreira, empresário e consultor especialista nas relações entre design e varejo (membro do comitê diretor do Retail Design Institute e do ICSC – International Council of Shopping Centers), como parte do projeto BLUE!, que foi promovido por ele no Núcleo de Criação, os integrantes foram convidados a assistir ao exuberante evento de design de varejo Inspiração 2010!. Em sua 4a edição, o encontro trouxe Phillip Rosenzweig, responsável mundial pelo Visual Merchandising para a Giorgio Armani Corp., e Oscar Peña, diretor de criação de iluminação da Phillips Design em Eindhoven, Holanda, e membro do comitê supervisor da Droog Design. Entre os destaques nacionais, Manoel Alves Lima, da F.AL (empresa promotora do evento), apresentou seu Diário de Bordo de Visual Merchandising, mostrando extrema sensibilidade à composição de linguagens fragmentárias, própria ao tempo atual. Lincoln Seragini, da Seragini Design, mundialmente reconhecimento pelo desenvolvimento de marcas e embalagens, lança a noção de marcas visionárias e mostra o modelo de raciocínio que utiliza para construí-las. Marimoon, blogueira e jornalista da MTV, coordenou um painel com Caito Maia, da ChilliBeans, e Paulo Pedó, da Melissa, sobre as peculiaridades do Consumidor Y. O Núcleo pôde conversar com os palestrantes e firmou relacionamentos preciosos.

Com Philip Rosenzweig, do grupo Armani, uma tarde inteira de conversas decorreu, com Andréa Naccache. Rosenzweig defendeu, em sua palestra, que havia algo “louco” no consumo de luxo. Para distinguir a histeria que leva as pessoas a buscarem grandes marcas, da “loucura” mais extrema que é a publicação do objeto de luxo – sempre fora dos parâmetros de mercado e excedendo qualquer demanda – Andréa Naccache apresentou a Rosenzweig o esquema dos quatro discursos de Jacques Lacan: discursos da obsessão, da histeria, do mestre (psicótico) e do analista. Defendeu o caráter psicótico da publicação do objeto de luxo e o quanto o discurso do analista precisa estar presente no cerne da criação deste produto extremo. A troca de e-mails é mantida.

Com Oscar Peña, até a data presente, uma infinidade de temas sobre gestão da criação no ambiente corporativo foram discutidas por telefone e e-mail com Andréa Naccache. Também o futuro do design brasileiro, suas oportunidades globais. Oscar Peña defende especialmente a qualidade do luxo nacional. A conversar...

Inspiração 2010! Público: 430 pessoas de 235 empresas.
Hotel Renaissance, São Paulo. 5 de maio

2. Uma Experiência do Limite. Após a visita ao restaurante Kinoshita no ciclo inaugural, este ciclo II trouxe uma nova atividade para os sentidos, uma segunda experiência da prática material de criação. Com direção da arquiteta Alessandra Suguimoto, e inspiração no documentário Esboços de Frank Gehry, estudado no Ciclo anterior, experimentamos a arquitetura a partir da maquete – sob a noção de que a criação acontece apenas a partir da definição, pelo criador, dos parâmetros estritos de seu trabalho. Isso acontece em todo trabalho que expanda os extremos da linguagem humana (e que portanto podemos definir como criativo): é preciso escolher a linguagem e o material, sob ao menos três critérios, para que haja possibilidade (condição mínima) de criação. Reconhecemos como importante essa experiência da pré-definição de limites, e os determinamos, nesse projeto. A proposta foi: (1) maquete, (2) material: papel metalizado, (3) projeto arquitetônico coletivo de um centro de cultura, onde as formas criativas se articulassem em torno de um núcleo de música e performance pública. Nosso projeto, realizado a quatorze mãos, será agora traduzido para os recursos de expressão da arquitetura tradicional (planta, descritivos) pelo escritório da arquiteta Alessandra Suguimoto.

3. Um estudo de psicanálise e criação. Neste ciclo, o tema é O Design da Emoção, palestra de Andréa Naccache apresentada na Associação Brasileira de Design de Interiores, ABD, em 16 de junho de 2010, como abertura do CONAD – Congresso Nacional de Design de Interiores. No Núcleo, esta palestra que comenta o estudo de Roberto Verganti (no livro Design Driven Innnovation, pesquisa realizada em Harvard) sobre a inovação baseada no significado foi detalhada e debatida. Um dito tradicional no mundo do design é “a forma segue a função”. Verganti coloca este fundamento de Louis Sullivan em discussão, para concluir que “a função segue o significado”. A proposta de Andréa Naccache é que a inovação de significado não é suficiente para explicar a radicalidade de trabalhos como o do arquiteto Frank Gehry ou dos designers Fernando e Humberto Campana, no Brasil. A questão do significado e do que o excede é bastante incidente na clínica de psicanálise, pela qual se pode apontar uma outra modalidade de “forma”, que, em princípio, nada tem a ver com a função e está além do significado – uma forma criativa que se define pela libido do corpo, não pelas medidas de ergonomia e engenharia de produtos. Essa distinção de “formas” – uma técnica, outra artística – ressoa a diferença, no idioma alemão, entre duas palavras para “corpo”- Körper e Leib. O primeiro é o corpo médico e mensurável, físico-químico, equivalente epistemológico da forma técnica e de engenharia, aplicada no design tradicional de produtos. O segundo termo alemão para corpo é Leib, e refere-se ao corpo sensual e desejante – em alemão, será esse o termo usado para falar de um espetáculo de ballet, dos movimentos do amor, da relação com as artes. Andréa defende que, mesmo que Gehry explique seu trabalho com imagens significativas, psicológicas, como fantasias infantis (ele fala sobre seus sonhos com peixes), permanece inexplicável a forma dada pelo seu corpo na criação das maquetes (Leib). É dessa forma libidinal e, no limite, não-significável, que a extrema novidade decorre. Com isso, Andréa apresenta um contraponto quanto à postura de empresas italianas como a Alessi que, apostando na psicologia e na interpretação de significados dos objetos pelo consumidor, busca acertar o desejo “mais profundo” das pessoas. Alessi consegue acertar, diz Andréa, não pela maneira como compreende seus projetos, mas sim porque permite o além do significado, ao convocar criadores capazes de suportar a angústia de um mergulho criativo radical, baseado no Leib.

O PROJETO BLUE!

Neste ciclo, um dos objetivos especiais do Núcleo Clínico teve sua primeira realização: atender a um cliente externo, atuando como agência de desenvolvimento de design e conceito, com orientação psicanalítica, oferecendo um processo criativo confeccionado para extrapolar o alcance do convencional brainstormingou das análises psicológicas e simbólicas.O grupo teve por cliente a J2B Innovation, de João Batista Ferreira, para o desenvolvimento sigiloso de uma marca, seu manifesto, o estabelecimento de objetivos de vanguarda e uma linha de comunicação gráfica para um negócio, sob a direção de Lincoln Seragini. O trabalho, com três meses de duração, envolveu a integralidade dos participantes neste primeiro projeto remunerado, e foi concluído com arte de Doda Ferrari. O processo criativo do grupo, que ofereceu a Seragini, entre outras ferramentas, um material inspiracional de mais de 30 páginas sobre a cor azul, considerando suas aplicações desde a química aos simbolismos culturais, e estudos sobre o espelho, as alternâncias entre dia e noite, sonho e realidade, luz e sombra, reflexos e reflexão, foi considerado por Seragini um dos mais ricos e competentes já presenciados em sua carreira internacional – o escritório de Seragini já operou em parcerias com Buenos Aires, Milão, Miami e Paris, e Lincoln é consultor em design da ONU.

1o. ENCONTRO NÚCLEO CLÍNICO + NÚCLEO DE CRIAÇÃO

Com o tema Princeton e a pesquisa matemática nos últimos séculos, o Núcleo de Criação, junto ao Núcleo Clínico em Psicanálise, receberam, em 31 de agosto, o matemático brasileiro Emanuel Carneiro, que aos 29 anos tornou-se professor em Princeton, universidade que acolheu Einstein, onde trabalham John Nash (Uma Mente Brilhante) e Andrew Wiles - que fez a prova do último teorema de Fermat, desafio dos maiores matemáticos da humanidade pelos últimos 350 anos. A descontraída conversa com Emanuel ajudou a situar o contexto e os objetivos do pensamento matemático, expondo a pesquisa matemática como processo radicalmente criativo, questionando verdade, vocação, utilidade e futuro do trabalho do matemático em geral e de Emanuel, pessoalmente. Nossa preparação para o encontro, em 26 de agosto, envolveu as leituras de Hardy – A Mathematician’s Apology – e de trechos de Simon Singh – “O último teorema de Fermat”, além de uma apresentação do filme “Fermat’s Last Theorem”, com apontamentos sobre a história de Andrew Wiles. Em nome do Núcleo de Criação, um carinhoso agradecimento a Emanuel, pela maneira alegre, clara e franca como expôs sua história, suas reflexões de vida e um senso do que é o universo de pesquisa matemática de excelência mundial.

PRÓXIMO CICLO

Abrimos inscrições para o próximo ciclo do Núcleo. Nesse trimestre, os trabalhos dos participantes serão sempre em duplas, em duas rodadas, uma de temas em aberto, para escolha das duplas, e outra com as duplas sorteadas para tratarem os seguintes temas: I – Autocrítica, II – Impermanência e construção, III – A relação com o outro e com o Outro, IV – Dinheiro e criação. A introdução de temas especiais indica um esforço de aprofundamento e qualificação dos trabalhos, que é objetivo do Núcleo deste ciclo em diante.

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